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CPT BAHIA

A CPT retoma sua caminhada quarentenal

Frei Luciano Bernardi, da coordenação executiva nacional, analisa os 40 anos da CPT numa perspectiva de retomá-los e revivê-los em nossa XXVII Assembleia Nacional, que será realizada na próxima semana, entre os dias 17 e 19, na cidade de Luziânia (GO). Na ocasião será escolhida a nova coordenação da CPT pata os próximos três anos.selo 40 anos_site - fundo_transparente

“Na próxima semana estaremos retomando o caminho dos 40 anos da CPT, também no mínimo das instituições que ela se deu para ser democrática, igualitária e fraternal. Mudaremos a Coordenação Nacional Executiva, daremos os retoques na construção do IV Congresso Nacional em Porto Velho (RO) e voltaremos a nos redobrar sobre a formação e a sustentabilidade pastoral e financeira desta nossa querida pastoral missionária.

Em tempos de fortes perplexidades, olhando para o nosso país e para dentro da CPT.

Com a certeza de que a bandeira da memória, esperança e rebeldia profética ainda não caiu de nossas mãos. Ou será que caiu? Desde que iniciamos a construção de nosso IV Congresso, as atitudes que mais se escutam, entre nós, são estas:

precisamos “escutar novamente os pobres: só isso pode salvar a CPT de um “naufrágio fatal”;

precisamos “reconstruir um consenso mínimo entre nós”

precisamos ter “uma postura unitária, que não significa uniforme, de nossas opções fundamentais.

Entre outras….

De uma fonte ecumênica, impressionou-me uma inspiração recente. Sobre “Romero. Santo para todo o povo de Deus. Discurso de Rowan Williams, arcebispo emérito de Canterbury, anglicano”, publicado na IHU: D. Romero foi “evento teológico”. Segundo ele, “um evento teológico é um evento no qual se assiste a uma espécie de reaproximação entre a Palavra de Deus e a palavra, ou talvez o grito sem palavras, do sofrimento”. E continua o arcebisbo emérito de Canterbury: “Como é sabido, o moto episcopal de D. Romero era: ‘Sentire cum Ecclesia’, pensar ou sentir com a Igreja. Uma frase que às vezes foi usada de maneira superficial para confirmar qualquer coisa que a Igreja diga através de seus expoentes. Significava, ao invés, algo muito diverso para o arcebispo Romero, Sentire cum Ecclesia é pensar, da e com a perspectiva dos deserdados. Pensar a partir de onde está Jesus. Para dizê-lo com James Alison, prestigioso intelectual católico contemporâneo, é aprender a ter a inteligência da vítima. Aprender a ver e a ler o mundo do ponto de vista daqueles que não têm poder, porque esta é a perspectiva de Cristo”.

Foi um dos seus amigos e colaboradores, o grande teólogo jesuíta Jon Sobrino, que definiu Romero “um evento teológico”. O que significa dizer da vida e da morte de alguém, ou mesmo de sua personalidade inteira, que esta constitui um “evento teológico”? Sobrino no-lo explica. Um evento teológico é um evento no qual se assiste a uma espécie de reaproximação entre a Palavra de Deus e a palavra, ou talvez o grito sem palavras, do sofrimento. A teologia, tão longe de ser uma especulação humana sobre Deus, chega ao seu mais alto nível de autenticidade quando se torna num certo sentido verdadeira expressão de Deus. Não a expressão de Deus que vem do alto, como muitos teólogos e bispos gostariam que fosse, mas a palavra de Deus que se exprime com e através de quem compartilha do sofrimento de Jesus e de sua glória.

Sobrino escreve: “O grito de um povo inteiro foi transformado pelo bispo Romero numa prece oferecida a Deus”. E, ao escutar e dar voz a este grito, na presença de Deus, Romero se torna um evento teológico: a Palavra de Deus e o grito de quem sofre estão ligados. (…) Romero acreditava que a parte mais importante de seu ministério consistisse precisamente em dar voz àqueles que não têm voz. Mas, naturalmente o seu dar voz ao clamor dos pobres era algo mais do que uma simples questão de palavras. Ele deu voz à experiência dos pobres correndo os seus mesmos riscos. Uma vez mais, como no caso de Jesus, tornar próprio o grito dos sofredores se torna isso mesmo risco e motivo de sofrimento. (…)

Descendo agora no meio dos meus pensamentinhos, terra, terra… sinto que, com o único objetivo de reavivar nossa perspectiva de compromisso cristão para a vida de leigos(as), religiosas(os) e presbíteros, bispos…, este nosso ano de 2015 deveria se colocar nesta trilha! É a trilha de São Oscar Romero, pastor e mártir.

Sem nenhum triunfalismo, mas com a responsabilidade que nos deixaram em herança nossos pais e mães fundadores e fundadoras, os quarentões da CPT, podem afirmar que temos, ao redor de Oscar Romero que papa Francisco proclamará santo “qui serus tamen = ainda que tardio”, uma densa nuvem de “testemunhas fiéis” aos quais solicitarmos luzes de inspiração de atitudes pessoais e de metodologia evangélicas. Alguns deles ainda vivem e nos sussurram dicas preciosíssimas, molhadas de suor e sangue…

Junto com Oscar Romero e todos/as os/as mártires, podemos afirmar que este momento da CPT é o momento de reconhecer que seus mártires e a própria CPT em si, constituem-se, eles próprios, num “evento teológico” no qual as humanidades no meio das quais vivemos, existimos e nos apelam “a uma espécie de reaproximação entre a Palavra de Deus e a palavra, ou talvez o grito sem palavras, do sofrimento humano e do nosso planeta Terra.

Bastem, entre todos e todas, a memória de Dorothy Stang e de Josimo Tavares….entre tantos e tantas que povoam nossa curta mas densa história.

Nossos mártires não resolverão, provavelmente, a tão anelada sustentabilidade financeira da CPT; esta, com seus “aplicativos” mais arrojados não poderão jamais substituir a força do testemunho do amor feito eficaz porque, teologicamente, pobre com os pobres que, padecendo injustiça, não aceitam pactuar ilusões, mas tão somente uma confiança recíproca e uma solicitação de partilha que poderá ser exigida em nome da cidadania, na sociedade, para os camponeses e camponesas e, na igreja, para seus missionários e missionárias. Sem jamais pactuar com ilusões do sistema que nega a ambos porque seus objetivos não admitem horizontes de colegialidade, autonomia e protagonismo, alternatividade… todas “flores pequenas” que vicejam e perfumam por baixo, o bosque evangélico de Carlos Mesters.

Bom reinício dos trabalhos da CPT em 2015. Que venham um Conselho Nacional e uma Coordenação Nacional que nos incentivem nas trilhas de Oscar Romero, Dorothy Stang e Josimo Tavares, Ezequiel Ramin…”.

 

Luciano Bernardi, com seus botões…

Salvador da Bahia, 12 de março 2015

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