Entre os dias 22 e 23 de novembro deste ano, representantes de diversas organizações sociais, pescadores/as, marisqueiras, ribeirinhos e pesquisadores/as participaram do I Seminário de Fortalecimento Comunitário da RESEX Cassurubá – I SERFORTE, em Ponta de Areia, Caravelas (BA). Esse evento foi organizado pela Reserva Extrativista de Cassurubá em parceria com a AHOMAR. A seguir, leiam a Carta de Cassurubá produzida pelos participantes no final do evento.
CARTA DE CASSURUBÁ
Nós, pescadores(as) de Caravelas, Nova Viçosa e Alcobaça – BA, organizações da sociedade civil, movimentos de pescadores e mulheres pescadoras, associações de pesca e mariscagem, pesquisadores de universidades públicas brasileiras, movimentos culturais e movimentos de atingidos pela monocultura do eucalipto, reunidos nos dias 22 e 23 de novembro de 2017 em Ponta de Areia, Caravelas, BA, vimos nos manifestar em defesa dos povos do mangue e do mar da RESEX Cassurubá, em seu enfrentamento pela manutenção do modo de vida das populações tradicionais, em defesa do ecossistema manguezal e marinho e contra a degradação social e ambiental provocadas pelas operações do porto particular da empresa FIBRIA (antiga Aracruz Celulose), financiado com grandes volumes de recursos do BNDES, banco público a ela associado.
Dentre os danos ambientais gerados pelo monocultivo do eucalipto, temos: o ressecamento e contaminação do solo, o desaparecimento de centenas de cursos d’água e nascentes, o desmatamento da mata atlântica, o declínio da agricultura familiar e do trabalho tradicional e a expulsão de dezenas de milhares de pessoas para as grandes cidades. A celulose produzida pela Fibria é, em sua maior parte, exportada para os países do Norte global, onde é transformada em papel e papelão, que servem de embalagem para bens de consumo e rapidamente se tornam lixo, num ciclo complemente insustentável.
Além da degradação e do racismo ambiental em terra, a Fibria vem causando danos acentuados ao ecossistema manguezal, que é o berçário do mar, ambiente onde se reproduz grande parte das espécies marinhas e essencial para a manutenção da vida no Banco dos Abrolhos, que possui a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul e é protegido pelo Parque Nacional Marinho dos Abrolhos.
As populações pesqueiras locais vêm sofrendo há 15 anos com os danos sociais e ambientais provocados pelas obras de dragagem impostas pela FIBRIA para garantir a passagem das barcaças com o eucalipto para a fábrica de celulose em Aracruz-ES. São eles: soterramento dos estoques pesqueiros, gerando perdas econômicas e insegurança alimentar nas comunidades; erosão de áreas de mangue que protegem as comunidades pesqueiras dos efeitos das mudanças climáticas; risco de naufrágio e morte por colisão contra a barcaça e toras de eucalipto que caem ao mar; riscos de acidentes em função das balizas sem iluminação; perdas de apetrechos de pesca de grande valor econômico e cultural; assoreamento de canais e rotas de pesca; contaminação por espécies exóticas descartadas nas lavagens dos lastros das barcaças; doenças e morte de corais pela lama do descarte, colisão com baleias e cetáceos, dentre outros.
Os plantios de eucalipto avançam sobre os limites da RESEX Cassurubá e de sua Zona de Amortecimento: são anos de plantios ilegais à beira do estuário do rio Caravelas e seus afluentes. Embora criminosa, é a empresa quem hoje criminaliza os pescadores e pescadoras, marisqueiras e ribeirinhos, quando buscam defender seus territórios de vida e direitos, em uma clara tentativa de silenciar a resistência local.
Mas já sabemos que é do meio do medo que nasce a coragem. Não nos intimidarão! Poluidores não passarão! Resistiremos a essa empresa violadora de direitos humanos e destruidora do mar e do mangue! Em aliança com movimentos locais, regionais, nacionais e internacionais, conclamamos a todos e todas – cidadãos, associações e movimentos sociais – a se juntarem a esta luta que é pela afirmação da vida dos povos tradicionais, dos ecossistemas costeiros e marinhos e dos entes encantados que os povoam e protegem. Fora dragagem! Fora deserto verde! Juntos somos mais fortes! Vida longa e potente aos homens e mulheres do mangue e do mar!!!
Foto: Thomas Bauer/ CPT Bahia.