A Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais, a Comissão Pastoral da Terra, o Sindicato de Trabalhadores Rurais de Santa Maria da Vitória e a Casa de Cultura Antonio Lisboa de Morais vêm a público informar, com indignação, que no dia 14 de dezembro a placa em homenagem ao advogado patrono da AATR, Eugênio Lyra, foi alvo de atentado na cidade de Santa Maria da Vitória, no oeste da Bahia. A placa e a sua base de sustentação simplesmente desapareceram.
Em 1976, recém-formado, o advogado transferiu-se para Santa Maria da Vitória, onde fixou residência, atendendo aos trabalhadores rurais e lutando pela retomada das terras dos camponeses que tinham sido usurpadas pelos grileiros. Contrariando poderosos interesses, justamente no período da expansão desenfreada da nova fronteira agrícola do oeste, Eugênio Lyra foi assassinado no dia 22 de setembro de 1977, por pistoleiro que agiu a mando da elite latifundiária. Nesta data, se preparava para depor no dia seguinte na então CPI da Grilagem na Assembleia Legislativa da Bahia. Desde então, tornou-se um símbolo da luta contra a grilagem de terras e violência contra trabalhadores rurais, inspirando ainda centenas de militantes da área jurídica a se alinharem na defesa dos direitos dos povos do campo.
Um conjunto de organizações, dentre elas a AATR, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Maria da Vitória e a Comissão Pastoral da Terra, inaugurou uma placa na sede do município, numa justa homenagem à trajetória deste grande lutador das causas populares e especialmente do campesinato baiano. Em nossa compreensão, não se trata de crime comum, razão pela qual descartamos a possibilidade que tenha sido um simples ato de vandalismo. Assim como na década de 70, neste mesmo ano de 2015, centenas de milhares de trabalhadores e trabalhadoras rurais, comunidades de fundos e fechos de pasto, quilombos e posseiros continuam sendo expropriados em massa das suas posses no oeste da Bahia, para dar lugar a “propriedades” que comumente ultrapassam 200 mil ha.
A grilagem de terras nesta região é uma constante desde que chegaram fazendeiros para implementar um projeto de desenvolvimento para o campo que é extremamente danoso para os camponeses. Nos últimos anos, intensificam-se a compra ilegal de terras por nacionais e estrangeiros; o desmatamento indiscriminado do cerrado para implementação das monoculturas de soja, algodão, milho e eucalipto; o uso intensivo de agrotóxicos; a ocupação irregular das veredas e o uso predatório das águas que brotam do aquífero Urucuia, fonte primária das nascentes dos rios que cortam a região e que constituem os principais tributários do Rio São Francisco.
Os governos, em todas as esferas, subordinam-se aos interesses das transnacionais que operam na região oeste, tendo recentemente apresentado um novo plano para expansão da fronteira agrícola sobre o cerrado que ainda permanece de pé, chamado de MATOPIBA (por abranger áreas dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). O fez, no entanto, sem qualquer procedimento de consulta às comunidades rurais que ainda resistem, em atendimento aos interesses do agronegócio e dos setores do Estado que lhe dá suporte financeiro e policial.
O atentado ao monumento em homenagem a Eugênio Lyra se configura como uma evidente ameaça aqueles e àquelas que permanecem vigilantes e em luta contra a grilagem e suas consequências nefastas, assim como pela conquista definitiva dos territórios das comunidades tradicionais. Não nos intimidarão. Seguiremos em frente denunciando as inúmeras violações de direitos praticadas pelo agronegócio e pelos governos que o apoiam. Exigimos, por fim, que sejam devidamente apuradas as circunstâncias do atentado e que haja responsabilização dos envolvidos.