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CPT BAHIA

Resistir para existir: comunidades se articulam ante ameaças de grileiros

De acordo com informações obtidas com a União das Associações de Fundo de Pasto de Casa Nova ( Unasfp), nesse município do norte baiano já foram identificados 21 casos de conflitos por terra este ano.  
Pensando em articular as comunidades camponesas que estão nesta situação, a Comissão Pastoral da Terra e a União dos Fundo de Pasto têm promovido uma  série de encontros.  A ideia é  discutir estratégias de resistência e defesa dos territórios rurais tradicionais. 
 
comunidades tradicionais

Entre as comunidades ameaçadas por invasores e grileiros está Algodão de Cima, onde mora o seu João Vicente. O camponês afirma que “um senhor chegou lá há pouco tempo querendo invadir; ele comprou uma pequena área e agora quer invadir outras áreas”. 
Seu João Vicente e sua comunidade, assim como outros grupos camponeses, geram sua renda a partir da criação de animais em terras devolutas de uso comunitário há várias gerações. E, diante das ameaças de grilagem, estão fortalecendo a organização comunitária por meio das associações de fundo de pasto.  
 
Para Marina Rocha, da CPT, além das comunidades se articularem para defender seu espaço, é preciso requerer a área de fundo de pasto ao Estado. “As comunidades ficam mais fortes quando se juntam, se reúnem regularmente, demarcam seu território, vigiam sua área.”
Ainda de acordo com Rocha, quem pretende se apropriar das terras dessas comunidades têm mudado de estratégia. ” Estamos vendo a judicialização dos conflitos. Isso porque alguns grileiros compram uma pequena área, outros  nem isso fazem, e aí se dizem donos de um pedaço bem maior e entram na Justiça contra os grupos camponeses da área”. 
 
Em Casa Nova, a busca por espaços para implantação de grandes projetos em  comunidades tradicionais é crescente. Um dos grandes empreendimentos é a construção de parques eólicos, como o que foi instalado na comunidade de Malvão.  Outras   comunidades têm relatado casos de invasões de áreas por parte de pesquisadores e funcionários de empresas do setor energético.  
 
O município é um dos preferidos entre os investidores desse tipo de negócio.  De acordo com o Atlas Eólico da Bahia, “sobre o município de Casa Nova, com 64,9 mil habitantes, sopram ventos com médias anuais de 7,0 m/s, tendo sido verificadas médias de até 8,0 m/s a 100 m de altura em algumas áreas”. 
O  interesse dos empresários nos ventos que perpassam por territórios tradicionais teria contaminado o governo baiano. Uma amostra dessa influencia foi exibida em 2013. 
Na lei 12.910/13, proposta pelo ex-governador Jaques Wagner, que trata da regularização fundiária das terras devolutas da Bahia, está previsto a celebração de um contrato entre o Estado e as comunidades tradicionais que ocupam essas áreas. 
Na versão do acordo contratual que o governo propôs, uma das cláusulas  previa a utilização dos territórios tradicionais para a instalação de projetos econômicos, entre eles parques eólicos. De forma articulada,  os/as camponeses/as rejeitaram  a proposta. Mas  o contrato continua ameaçando a permanência das famílias camponesas.

“O contrato não é um ganho, uma vez que as comunidades continuarão na insegurança. Ele tem várias cláusulas que a gente considera abusivas. Inclusive a rescisão unilateral desse contrato quando houver o interesse do Estado”, explica Zacarias Rocha, da Articulação Regional dos Fundo de Pasto. 

Ocupando os territórios de forma secular, as comunidades lutam pelo título de domínio das terras. Já o governo incentiva a concessão real de uso.

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