O povo quilombola está presente aqui
Lutando pra acabar com a escravidão (BIS)
Quando o povo chega, entra na peleja, sempre está presente,
Logo sem demora entra na história, muda o ambiente.
Se há alguém aqui que ainda não entendeu procura entender,
O povo quilombola luta com a certeza de que vai vencer.
Quanta crueldade foi detectada nos antepassados,
Índios perseguidos pelos portugueses sendo maltratado,
Trabalharam noite, trabalharam dia sem ter um salário,
Chamados de negros, nada recebiam, eram escravizados.
Escravos fugiam formando quilombos com necessidade,
Só assim teriam um pouco de alegria, mais prosperidade.
Povo quilombola foi caluniado com a desigualdade.
(Povo quilombola de Gilmar Barboza Santos,
Quilombo Boa Vista do Pixaim, Muquém do São Francisco/BA).
Somos comunidades tradicionais, quilombolas e de fundo e fecho de pasto, habitamos em nossos territórios há séculos. Somos camponeses diversos e olhamos para o futuro com consciência de nossas identidades, das origens e do futuro que queremos. Mudamos e evoluímos com o passar dos anos, e queremos decidir nosso rumo. Queremos construir nossa identidade livre e num sentido emancipador. Denunciamos a todos aquelas -empresas, Estado, latifundiários- que querem nos enquadrar em caixinhas fechadas. Renegamos a todos que usam nossa identidade sob um princípio de controle e homogeneização.
Exigimos justiça e os direitos que continuam nos negando. Estamos cientes dos retrocessos, dos poucos avanços e precárias conquistas no contexto atual. Estamos na luta pela nossa sobrevivência. Nos juntamos para somar forças frente a política de morte contra as populações negras, contra camponeses, assentados, mulheres, ambientalistas, índios e povos tradicionais. Consideramos que as reformas administrativas que colocam os processos de demarcação do INCRA sob responsabilidade do Ministério de Agricultura e o irrisório orçamento destinado aos mesmos supõem na prática uma vontade de bloquear nossos direitos ao território. As comunidades de Fundo e Fecho de Pasto, devido aos obstáculos colocadas pelo Estado da Bahia para dificultar seu reconhecimento e autonomia dos territórios, hoje numa situação trágica. Denunciamos às empresas que compram ao poder político, seduzem nossas lideranças e dividem nossas comunidades para roubar nossas terras. Denunciamos as pressões e lobbies dos ruralistas para que o Brasil abra mão da convenção 169 da OIT que garante nosso direito de autorreconhecimento. Frente às pressões de expansão da propriedade privada no campo, que exclui e expulsa as pessoas de suas terras, reafirmamos os princípios dos territórios comuns baseados na democracia comunitária e práticas costumeiras de inclusão.
Precisamos de uma educação contextualizada que faça com que as novas gerações valorizem os saberes locais, a história de nossos povos, o sentido de suas lutas. A escola, tal e como é imposta pelo Estado, aliena a nossos jovens de suas raízes. Esta escola é fonte de promessas abstratas de melhoria social, mas que só gera frustrações. Exigimos uma educação de qualidade e adaptada a nossa realidade. Uma educação que contribua também com as nossas lutas e nossos direitos de morar em nossos próprios territórios, com nossas próprias cosmovisões, nossos jeitos de viver, fazer e criar.
Nossa luta é uma luta cotidiana, para transformar nosso dia a dia. Somos comunidades nas nossas lutas, nas celebrações, nos trabalhos, nos momentos de sofrimentos e nos cuidados com o outro. Estamos comprometidos com a vida em sua complexidade, em sua diversidade de gênero, étnicas, religiosas e espirituais, no respeito aos seres humanos e toda a criação. Denunciamos as investidas da cultura consumista e individualista que rompem com os vínculos comunitários que nos caracterizam. Denunciamos as influencias da mídia e de algumas igrejas que não olham para as condições de injustiças e de pobreza em que vivem grande parte de nosso povo, que oferecem esperanças baseando-se na redenção individual e no descomprometimento com o/a outro/a.
Somos comunidade todos os dias. Lutamos todos os dias. Por isso, reafirmamos que, mesmo que a conjuntura parece complicada, re-existiremos. Já passamos por piores momentos. Somos sujeitos da história, somos comunidade em ação constante, somos povos tradicionais, quilombolas e de fundo e fecho de pasto.
Senhor do Bonfim, 31 de Agosto de 2019.