Na última quarta-feira, dia 13 de junho de 2018, 30 representantes das famílias atingidas pelo Projeto de Irrigação Baixio de Irecê, nos municípios de Xique-Xique e Itaguaçu da Bahia, (à margem direita do rio São Francisco no semiárido baiano) acompanhados pela Comissão Pastoral da Terra – CPT, participaram de audiência na sede da Coordenação de Desenvolvimento Agrário – CDA, em Salvador, para tratar da primeira etapa da Ação Discriminatória Rural em porção diminuta dos territórios das 18 comunidades de fundo de pasto.
A CDA, através da portaria publicada no Diário Oficial do Estado, deflagrou procedimento administrativo de discriminação de terras devolutas em imóveis localizados fora do perímetro irrigado, com aproximadamente seis mil hectares de extensão, em Xique-Xique, por entender que não seriam áreas de conflito. No entanto, a área a ser discriminada não atende às reivindicações das mais de 700 famílias das 18 comunidades, entre Xique-Xique e Itaguaçu da Bahia. Estudo preliminar realizado pela própria CDA identificou cerca de 124 mil hectares como o território declarado pelas comunidades, compreendendo parcela das terras griladas violentamente nos anos de 1970 e posteriormente adquiridas pela Companhia de Desenvolvimento do Vale dos Rios São Francisco e Parnaíba – CODEVASF.
Os integrantes das comunidades presentes destacaram as diferentes formas de expropriação (grilagem, violência física, psicológica, expulsão da terra, proibição de criar seus animais no modo tradicional do fundo de pasto etc.) vividas por seus familiares desde a década de 1970 até os dias atuais, primeiro com a ação de grileiros de terras na região (para fins de criatório de gado – ou será especulação?), depois com o processo da construção do perímetro irrigado.
Além de fazer a memória das diversas formas de violência experimentadas com a construção do Projeto de Irrigação Baixio de Irecê, relataram novas situações de conflitos, violência e ameaças às famílias por fazendeiros da região. O projeto de irrigação coloca em perigo o modo de vida das famílias das comunidades tradicionais, a existência do Rio São Francisco e, consequentemente, compromete o abastecimento de água à população dos municípios da região de Irecê que dependem de suas águas. Além disso, constata-se um aumento grande de desmatamento que chega a ultrapassar mais de 16 mil hectares de caatinga numa região e bioma já bastante fragilizada.
Os/as moradores/as das comunidades questionaram o tratamento e o desrespeito do Estado da Bahia em relação aos seus direitos territoriais, culturais, ambientais e sociais e, como afirmou Dona Ivete, “Nós não roubamos nada de ninguém, só estamos exigindo o que é nosso, eles é que roubaram nossas terras e nosso território.”
Assim como Dona Ivete, outras pessoas demonstraram sua indignação em relação à negação de seus direitos por uma empresa pública, a CODEVASF e às dificuldades do Estado da Bahia e brasileiro em efetivar os direitos reconhecidos às famílias uma vez reconhecidas como comunidades tradicionais.
Reivindicaram que esta etapa da Ação Discriminatória Rural não seja o fim e sim um processo participativo e transparente, sendo o prelúdio da segunda etapa que tratará das áreas em conflito, na perspectiva de fortalecer e garantir o modo de vida das famílias das comunidades.
Comissão Pastoral da Terra/ CPT Bahia
Fotos: Thomas Bauer/ CPT Bahia