Fonte: http://www.cimi.org.br/site/pt-br/
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) lançou na última quinta-feira (17 /07), na sede da CNBB, o relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil que sistematiza os dados de violências cometidas contra os povos e comunidades indígenas em 2013. O panorama político explicita que as recentes investidas e ataques contra os direitos dessas populações têm um reflexo direto nas aldeias em todo o país. A paralisação das demarcações de terras, a tentativa de retirar direitos garantidos através de projetos de emenda à Constituição, portarias e decretos, a proposta de modificar o procedimento administrativo de demarcação das terras e as manifestações ruralistas realizadas em vários estados, dentre outros atos anti-indígenas, tiveram como consequência o acirramento dos conflitos que envolvem a disputa de terras.
Há mais de 20 anos o Cimi sistematiza informações levantadas por suas equipes espalhadas pelo Brasil, que atuam próximas ou até mesmo nas próprias áreas indígenas. Dados pesquisados junto aos órgãos públicos e notícias veiculadas pela imprensa também servem de base para o relatório.
Dividida em quatro partes, a publicação traz no primeiro capítulo as seguintes categorias: omissão e morosidade na regularização das terras indígenas; conflitos relativos a direitos territoriais; e invasões, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio. A segunda parte apresenta as violências cometidas “contra a pessoa”, dentre elas constam assassinato, ameaça de morte, abuso de poder, homicídio culposo, lesão corporal dolosa, racismo e discriminação e violência sexual, dentre outras. Já o terceiro capítulo traz dados sobre as violências causadas por omissão do poder público, como desassistência geral e desassistência nas áreas de saúde e educação, morte por desassistência, mortalidade infantil e suicídio. E, por último, há informações sobre os povos indígenas que vivem em situação de isolamento ou de pouco contato no Brasil e as principais ameaças a que estão sujeitos.
O relatório explicita que a presidenta da República Dilma Rousseff continua tendo a pior média de homologações de terras indígenas desde o fim da ditadura militar, com 3,6 homologações por ano. Em todo o ano de 2013, apenas uma terra foi homologada, a Terra Indígena Kayabi, no Pará. Mas nem mesmo esta terra pôde ter seu registro efetivado, visto que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, concedeu liminar contra o seu registro em cartório. Portanto, nenhum procedimento demarcatório foi concluído em 2013.
Em relação à saúde indígena, a situação é de total omissão. “A constatação de que a cada 100 indígenas que morrem no Brasil 40 são crianças torna inegável o fato de que está em curso uma política indigenista genocida”, afirma Dom Erwin Kräutler, bispo da Prelazia do Xingu e presidente do Cimi.
Sobre a ocorrência de suicídios, dados oficiais da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), divulgados em maio deste ano pelo Cimi, mostram uma realidade bastante devastadora no estado do Mato Grosso do Sul: 73 casos em 2013, uma média de um suicídio a cada cinco dias. Este índice configura-se como o maior em 28 anos, de acordo com os registros do Cimi. Dos 73 indígenas mortos, 72 eram do povo Guarani-Kaiowá, a maioria com idade entre 15 e 30 anos. No período de 1986 a 1997, foram registradas 244 mortes por suicídio entre os Guarani-Kaiowá do estado, número que praticamente triplicou na última década. De 2000 a 2013 foram 684 casos.
Além da presença de Dom Erwin e da coordenadora do relatório, a antropóloga Lúcia Helena Rangel, uma liderança indígena do povo Tenharim também estará presente no lançamento do relatório. Quase exterminados pela construção da rodovia Transamazônica na década de 1970, dos cerca de 10 mil Tenharim sobreviveram pouco mais de 100 pessoas naquela ocasião. Em dezembro de 2013, eles foram envolvidos no que consideram ser “o segundo massacre do povo”, quando foram responsabilizados pelo desaparecimento de três não indígenas na Transamazônica. Incitada por madeireiros, a população de Humaitá se revoltou contra os Tenharim, queimando um barco, vários veículos e os prédios da Fundação Nacional do Índio (Funai) e da Sesai, além de terem ameaçado e discriminado radicalmente os indígenas, que ainda foram violados em seus direitos pelas próprias forças policiais em suas aldeias. Em um dos casos mais emblemáticos de violência, ocorrido no ano passado, os Tenharim foram condenados pela mídia sem que tivessem sequer sido ouvidos. E, apesar da falta de provas, cinco indígenas estão presos em Porto Velho.
“Existem muitos madeireiros que têm raiva da gente porque eles não podem invadir a reserva para tirar madeira. Tempos atrás, com as operações da Funai e de outros órgãos, eles tiveram carros e tratores apreendidos e ficaram com mais raiva. O que eles fizeram foi aproveitar o momento para se unirem contra nós, se articulando com a população. Foram eles que bancaram o protesto, quando invadiram nossas aldeias”, afirmou a liderança Ivanildo Tenharim, na época da violenta manifestação contra o seu povo.