Reunião da Fundação da CAE (Comissão de Acompanhamento de Empreendimento) da Brazil Iron ocorreu na última quarta-feira (18.05) na Escola Municipal da Bocaina, Piatã-Ba. Os representantes escolhidos pela empresa foram chamados para compor a mesa; Tijuco, Mocó, Rio de Contas e Bocaina, bem como representantes do Comitê de Bacia do Rio de Contas, da Coopiatã e do Sindicato de Trabalhadores Rurais. Todos então tomaram seus assentos, com exceção da presidenta da associação da Bocaina.
Enquanto apontavam os benefícios e ações positivas da mineradora para as comunidades, incluindo uma horta para doar alimento saudável para as casas de repouso de Piatã e Abaíra e a preocupação com as águas, uma moradora da Bocaina perguntou “se a água é um bem tão precioso, porquê vocês poluem tanto?” Depois de explicações vagas, o microfone passou por algumas mãos até que o Gerente Geral Daniel Ribeiro, informou que “O objetivo é justamente trazer todos esses questionamentos para debater na comissão. Não necessariamente este é o espaço neh… que a gente vai lidar com isso ou debater. Gostaria muito que você transmitisse seu questionamento através de sua representante, pois o objetivo aqui é ler o estatuto e criar esse canal de diálogo (CAE).” Completou afirmando que ali não era um debate nem uma audiência pública.
Na sequência, a presidenta da associação da Bocaina, Catarina, explicou o motivo por não ter se sentado à mesa. “Não me senti à vontade para sentar à mesa e representar a comunidade quando tem dezenas de bocaneiros presentes aqui, que podem falar. Se estivéssemos longe, tudo bem… Mas estamos todos aqui.” E pediu para que todos da comunidade presentes levantassem as mãos. Concluindo que a comunidade inteira, tem o direito de fala e não apenas uma pessoa.
Profa. Patrícia, (filha da Bocaina) também pediu a fala “ Concordo com alguns nomes que vocês escolheram para compor a comissão, mas achei que a CAE seria constituída aqui, em coletivo.” E sinalizou a falta de um representante da educação ou mesmo dos jovens (alunos). “Sendo que estamos justamente em uma escola.” A forma como os membros da comissão foram escolhidos também foi questionada pelo Prof. Dorivan do Rio de Contas e afirmou que faltam comunidades representadas. A ausência de convite às universidades que atuam com pesquisas e extensão na região (UEFS, UNEB e UFBA) também foi sinalizado por Ana Carolina do Comitê de Bacia do Contas.
Muitas outras perguntas surgiram, mas o discurso era reiteradamente repetido pelos funcionários da BI: “aqui não é espaço para debater, não é audiência pública.” Os questionamentos deveriam ser enviados aos representantes e discutidos depois nas reuniões da CAE. Mesmo assim o debate se prolongou por horas, o regimento/estatuto da CAE não foi lido e a mineradora deu a reunião por encerrada.Mas não sem antes determinar; “se não há mais objeções, damos esta CAE por criada e a próxima reunião será no dia 14.06.”
Contudo, ainda há muitas objeções e dúvidas que não foram respondidas conforme trecho da nota pública enviada pelo coletivo de instituições que apoia as comunidades:
“Primeiramente a empresa não informa sobre qual empreendimento o CAE está se referindo. Como não há nenhum licenciamento válido em nome da Brazil Iron, a CAE terá validade para qual ou quais empreendimentos? Quais empreendimentos a Brazil Iron tem na região? Quais outras instituições vão ter direito a participar? Quais critérios foram usados para convidar as instituições? Em qual base legal esta comissão se alicerça? “
Em nota, o Movimento pela Soberania Popular na Mineração trouxe explicações sobre as CAEs:
“As Comissões de Acompanhamento do Empreendimento (CAEs), do modo como são implementadas, acabam por reproduzir e reforçar uma característica modelo de mineração brasileiro: a falta de democracia e de participação popular. Perceba que a CAE não é um mecanismo de participação, pois para garantir participação, seria preciso que as pessoas tivessem condições de decidir algo. Na CAE, algum representante de cada entidade, em regra escolhido pela própria empresa no processo de mobilização para formação da comissão, pode no máximo falar sobre os problemas, todavia, nas reuniões nenhuma decisão é tomada. A empresa divulga, via de regra, que fez uma reunião transparente, aparentemente integrando a comunidade dando a impressão de que respeita a população local.
É isso que está em jogo na formação da CAE em Piatã pela empresa Brasil Iron. Sendo nada mais que uma exigência do INEMA após interdição das atividades da empresa, sua realização está sendo obrigatória, de modo que a empresa só a faz para superar o empecilho da interdição e voltar a operar do mesmo jeito. Para se ter uma ideia, a empresa visivelmente investiu mais tempo e energia em divulgar o quanto é democrática, transparente e em prol da integração das comunidades, do que em explicar às comunidades como funciona a CAE, a que empreendimento a CAE se refere, qual situação de suas licenças etc.
Por isso, a CAE é, na prática, uma fachada, feita pela empresa como uma obrigação e visando apenas acabar logo com a interdição e voltar a gerar impactos sem o menor respeito à comunidade. Diante disso, cabe às comunidades, população da cidade e às organizações interessadas denunciar o caráter antidemocrático da CAE e do modelo mineral em curso no país, e exigir de fato, da empresa e do poder público, espaços e mecanismos de participação e decisão, através dos quais as comunidades possam decidir o quanto o empreendimento pode expandir no território, quais limites devem ser respeitados para preservar a saúde da população, a água, o solo, plantas e os animais, entre outros aspectos.”
Nascente do Bebedouro assoreada por pó de minério
Assinam:
Coletivo Comunidades Unidas
Coletivo Floresta Viva
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Fórum popular da Natureza – FPN
Frente Socioambiental de Piatã – FSP
Grupo Ambientalista da Bahia – GAMBÁ
LEVANTE- Movimento Socioambiental da Chapada
Observatório dos Conflitos Ambientais da Chapada – OCA
Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM
Movimento SOS Bocaina e Mocó
Mutirão Agroecológico de Piatã
Rede Chapada Agroecológica
Sos Bacia do Rio de Contas
Teia dos Povos