Nos últimos anos, tem crescido a visibilidade social e política das mulheres em diversos espaços e, com isso, tem aumentado o nosso reconhecimento, por parte da sociedade, enquanto produtoras de conhecimento, tecnologia, inteligência organizativa, bens e produtos, etc. Isso parte da luta e organização constante ao longo da história da humanidade, olhando desde a constituição dos povos, passando pelas invasões europeias, explorações e guerras que se seguiram, até os dias atuais em que persistimos na residência contra as diversas formas de opressão. No entanto, ainda hoje, embora se reconheça a relevância das conquistas de direitos, alcançadas por meio da luta de trabalhadoras e trabalhadores, nem sempre somos valorizadas como protagonistas, e somos invisibilizadas também na escrita.
No caso das mulheres camponesas, cujas experiências de vida estão sendo consideradas neste texto, são aquelas que não abandonam as atividades domésticas, mas acrescentam mais trabalho ao seu dia a dia, com o objetivo de alimentar a família e comercializar produtos agrícolas, além de, em diversos casos, atuarem como militantes políticas nas comunidades e regiões onde vivem. Por consequência, essas mulheres, fundamentam a luta por construção de certa autonomia e mobilidade na ampliação da jornada de trabalho e na intensificação das atividades produtivas.
Diante da pandemia do coronavírus, as mulheres camponesas buscam alimentar os povos de comunidades rurais e periferias urbanas, através da produção de hortaliças, grãos, frutas e verduras, dentre outros alimentos agroecológicos, garantindo a alimentação saudável e segura para o conjunto familiar e à comunidade ao seu redor. Além de parceiras e parceiros que integram sua rede, ao mesmo tempo em que garante a renda, através da venda direta ao consumidor, de modo que, através do trabalho coletivo em rede, entre comunidades tradicionais, as mulheres lideram o trabalho com outras mulheres, com os jovens e com homens.
A vida das camponesas, que almejam sua garantia de direito, não é nada fácil. O reconhecimento do papel produtivo junto à participação no trabalho familiar é resultado de lutas sociais intensas, ao lado de outros trabalhadores rurais, em que grandes lideranças femininas estão à frente defendendo essa garantia de direito e visibilidade, nesta sociedade machista, racista e capitalista, onde parte da população ainda acha que lugar de mulher é em casa cuidando dos afazeres domésticos e dos filhos.
São muitas as barreiras a serem rompidas, mas aos poucos, com luta e muita organização, as conquistas virão. O que temos observado é que, em muitos casos, as esposas redefiniram ou recriaram práticas tradicionais, fundamentadas em correspondente distinção de papéis, e assim continuaram a oferecer suporte à reprodução familiar. E neste processo e capacidade de estarmos sempre nos reinventando, que nós conseguimos exercer com excelência os papéis de camponesas, produtoras, chefas de família, mães, esposas e amigas. E, a partir disso, junto com nossos companheiros ou companheiras, criamos nossos filhos ensinando o valor que se deve dar à mulher, a mãe terra e a tudo que nela se produz.
Por fim, compartilho com todos a fala da companheira Diene Sena Lima jovem agricultora da comunidade Água Verde, localizada na região de Cândido Sales, próximo ao Rio Pardo. Ela expressa um sentimento belo de como a família tem se organizado diante a pandemia do coronavírus para manter a produção e continuar abastecendo as famílias da cidade.
De acordo Diene Sena Lima: “Não tem riqueza maior do que a gente cultivar o próprio alimento, um alimento saudável, isso é maravilhoso, veja o tamanho deste pé de alface, ele é enorme e cem por cento orgânico, produzido de forma agroecológica, e eu fico até emocionada de falar, da grandiosidade e preciosidade dessas hortaliças e demais legumes, verduras e frutas aqui do quintal de nossa casa, em nosso sítio. Só nos resta agradecer a Deus por tamanha benção, e a todos os parceiros de caminhada que sempre estão por aqui partilhando conosco as experiências.”
O relato da companheira só nos dá a certeza de que estamos no caminho certo, e que é possível sim a transformação da sociedade, que todas as camponesas do Brasil e do mundo conquistarão seus espaços. É através de mulheres como elas e outras que muitos alimentos de qualidade chegam às mesas da sociedade, pois além da coragem de colocar as mãos na terra para plantar e colher, existe uma força enorme e o desejo de uma sociedade justa e igualitária, onde todos e todas tenham em suas mesas o que comer.
Edilene Alves Silva – Agente da CPT Bahia, graduada em Serviço Social e pós-graduada em Políticas Públicas e Gestão Social