A Vila Juerana, localizada na zona norte de Ilhéus (BA), sediará nos dias 26 e 27 de março (sábado e domingo) o 1º Mutirão de Saúde Popular da região. A atividade contará com equipes de atendimento que receberão o público gratuitamente, previamente agendado através de triagem realizada pelos terapeutas, em salas do prédio da Associação de Moradores da Vila Juerana. Além dos atendimentos, no sábado (26) também acontecerão duas oficinas gratuitas no Prédio Escolar da Vila Juerana. A “Oficina de Alimentação e Saúde: como fazer a Multimistura” ocorrerá das 9 horas às 11:30 da manhã, tendo como facilitadora Mildaiza Soares, do Clube de Mães de Cordeiros. Já pela tarde, a “Oficina de Saúde Natural para Mulheres” ocorrerá das 14 horas às 16:30, tendo como facilitadora Ellen Flamboyant, da Coletiva Flor de Cacau.
O evento faz parte das atividades do Curso de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) promovido pela equipe Sul-Sudoeste BA da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pela Associação de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (APICS) em parceria com organizações e movimentos populares como o Clube de Mães de Cordeiros; Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM); o Levante Popular da Juventude; Cáritas; Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE); Misereor; DKA; e Horizonte 3000.
O curso vem acontecendo desde o início de 2021, com encontros virtuais e presenciais, e com atividades teóricas e práticas, além dos encontros para realização de mutirões nas localidades de atuação dos estudantes, cuja turma é formada por representantes de comunidades tradicionais e fundo e fecho de pasto, quilombolas, lideranças pastorais e de movimentos sociais, totalizando 20 terapeutas em formação.
As PICS e a importância da saúde popular nos territórios em conflito
As Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) são sistemas e recursos terapêuticos que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de doenças e da recuperação da saúde por meio da aplicação de técnicas eficazes e seguras, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade.
Os atendimentos promovidos pelo curso das PICS, que também deverão ocorrer em outros territórios da Bahia, funcionam como estágio coletivo de vivência nas comunidades, fazendo parte dos processos didáticos e pedagógicos do curso, além de também servirem para divulgar essas práticas nas comunidades. Serão aplicadas técnicas como o uso de plantas medicinais em forma de chás, tinturas, xaropes e pomadas, geoterapia, inalação, reiki, florais, auriculoterapia e ventosaterapia. Esses terapeutas em formação se tornarão multiplicadores dessas práticas, promovendo a saúde popular comunitária em seus territórios.
O objetivo do curso é tornar essas práticas acessíveis a pessoas de baixa renda, em situação de vulnerabilidade e de comunidades tradicionais através da formação de terapeutas que façam parte dessas comunidades. Entende-se que é fundamental construir experiências populares de cuidado em saúde que possam tanto acolher os processos de sofrimentos nas comunidades quanto fortalecer a organização política pela reivindicação e construção das políticas públicas de Saúde, tendo em vista que essas práticas possam ser assumidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) na prevenção e orientação de uma vida saudável.
Mutirões de Saúde Popular como o que ocorrerá neste fim de semana visam o resgate dos saberes populares, a exemplo do uso medicinal de ervas e raízes, para criar experiências de intervenção em saúde coletiva vinculadas à compreensão de como o contexto político e social afeta as condições de saúde das pessoas. Dessa forma, o desenvolvimento do curso das PICS entre líderes comunitários e representantes de movimentos sociais ligados a territórios em situações de conflito e vulnerabilidade significa uma oportunidade de fortalecimento da luta nas comunidades através da cura e do cuidado físico e emocional das pessoas que estão na linha de frente desses embates.
Essas práticas estão em sintonia com as lutas territoriais, pois discutir práticas integrativas de saúde não é dissociável das lutas sociais, por terra, por água e pelo meio ambiente, pois nesses contextos estão os principais fatores que condicionam a saúde física e mental e a qualidade de vida dessas populações. As PICS têm uma relação direta com a sua implementação nas lutas territoriais visando o fortalecimento das lutas camponesas e da identidade desses povos, pois o enfrentamento a esses conflitos gera diversos tipos de adoecimentos. Nos territórios atingidos pela mineração, são crescentes os casos de pessoas com problemas respiratórios e outros problemas de saúde devido a contaminação da água, do ar e da terra pelo pó de minério. A exemplo disso, a Vila Juerana tem protagonizado a luta contra a implantação do Porto Sul, cujas obras já têm impactado a qualidade de vida da população. Se as obras do porto e também da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL) forem concluídas, esses impactos se agravarão de forma avassaladora, trazendo a contaminação do pó de minério para toda a região. Por essa razão, a inserção de práticas integrativas e populares de saúde na comunidade da Juerana, bem como em outras localidades atingidas pelo avanço do capital, pode se tornar uma importante ferramenta de resistência popular.