As três bacias hidrográficas mais ricas em biodiversidade no planeta estão ameaçadas por um mesmo “inimigo” comum: a construção de usinas hidrelétricas.
A análise é de um grupo de cientistas de países como Brasil, EUA, Alemanha, Canadá e Camboja. Está na revista científica “Science” desta semana, em uma seção que traz debates de cientistas sobre temas atuais.
De acordo com os cientistas, um terço dos peixes de água doce do mundo vive nas bacias hidrográficas da Amazônia, do Congo (África) e de Mekong (no sudeste asiático). Esses animais convivem com a construção de usinas, de represas e de barragens para a produção de energia elétrica.
O problema é que boa parte desses peixes migra conforme a vazante dos rios. Com as barragens, eles podem ficar pelo caminho.
“Há espécies de alto valor que viajam centenas de quilômetros em resposta a pulsos de inundação sazonal”, escrevem os autores.
Pelo menos 450 barragens ainda devem ser construídas nas usinas dessas três bacias, aponta o estudo. Só o rioMekong, por exemplo, já tem 370 barragens e deve ganhar mais cem delas nos próximos anos.
No Brasil, o debate é sobre a construção da usina Belo Monte, que está sendo erguida em Altamira, no Pará. Uma obra controversa de R$ 30 bilhões no coração da floresta amazônica.
Quando estiver funcionando, a usina poderá produzir, estima-se, energia doméstica para 18 milhões de pessoas.
De acordo com o trabalho da “Science”, Belo Monte pode estabelecer um recorde mundial de perda debiodiversidade. Isso porque há um número excepcional de espécies que só vive ali.
“As espécies de peixes não estão uniformemente distribuídas ao longo destas bacias. Muitas sub-bacias e afluentes têm espécies únicas que não são encontradas em nenhum outro lugar”, explica Kirk Winemiller, líder do estudo e especialista em vida selvagem e peixes da Universidade do Texas.
Um exemplo disso está aqui no Brasil, no rio Xingu, afluente do Amazonas. “Há dezenas de espécies de peixes que só existem ali”, diz Winemiller.
De acordo com os cientistas, faltam protocolos para orientar a construção de hidrelétricas em regiões tropicais ricas embiodiversidade.
Para o grupo, as instituições que financiam a construção de hidroelétricas devem exigir estudos científicos que mostrem o impacto da obra na biodiversidade e nas mudanças climáticas.
“Estamos defendendo uma melhor avaliação dos custos e benefícios de usinas hidrelétricas com base científica”, explica Winemiller.
Por Sabine Righetti
Publicado por Folha de S. Paulo em 08/01/2016.