As empresas mineradoras ignoram o cenário que vive o país, no qual mais de 32 mil pessoas perderam suas vidas e mais 590 mil foram contaminados (Ministério da Saúde) e sofrem em filas de hospitais, inclusive, alguns destes no município de Piripá (BA), para implementar seus projetos. Estas iniciativas, além de desrespeitosas, agrava ainda mais a violação de direitos, sejam eles individuais e coletivos, mesmo porque os projetos de mineração causam impactos socioambientais, alguns deles irreversíveis.
Piripá está localizada no Sudoeste do estado da Bahia e divisa com o estado de Minas Gerais, pela Serra Geral. De acordo como dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o município tem cerca de 12 mil habitantes, sendo sua área geográfica coberta pelos biomas Caatinga e Cerrado. A Serra Geral determina a divisa entre os dois estados e o bioma predominante nesta área é o Cerrado, rico em biodiversidade e fontes de água, o que torna estes espaços motivo de cobiça por empresas do ramo da mineração e eucalipto.
A sub-região conta também com os municípios de Presidente Jânio Quadros, Tremedal, Condeúba e Cordeiros, os três últimos, tecnicamente, possuem as mesmas características geográficas e problemáticas, mesmo porque todos estão encravados às margens da Serra Geral.
O Cerrado ou Gerais como é conhecido pelas comunidades na região, o bioma mais antigo do Brasil de onde vêm as fontes de água que nascem da Serra e abastecem comunidades centenárias. Trata de um modo de vida tradicional, sendo o extrativismo de plantas medicinais e frutos do Cerrado e a criação de animais à solta a marca do modo de vida destas populações. Não obstante, 12 comunidades destes municípios requerem junto ao órgão estadual (Secretaria Estadual de Promoção da Igualdade Racial – SEPROMI) seu autorreconhecimento com Fecho de Pasto, sendo que quatro delas já são reconhecidas pela Secretaria.
Apesar da rica biodiversidade contida na região e dos modos de vida tradicionais que permanecem ali, a exploração mineral tem sido recorrente e causado inúmeros conflitos. Em um plano mais recente destes conflitos, as comunidades de Pedra Branca e Palmeira, em Cordeiros, Bunito e Queimada, em Piripá, vivem problemáticas comuns quanto à exploração mineral.
Pedra Branca foi pega de surpresa, por volta de 2010, por empresa que pretendia explorar uma “pedra branca”. A comunidade se mobilizou junto a entidades parceiras, e, inclusive, foi realizada uma Romaria, a propósito, a mineradora não conseguiu se efetivar. Vale ressaltar que esta comunidade já requereu seu autorreconhecimento como Fecho de Pasto e espera resposta do órgão responsável. Já Palmeira, no mesmo município, vive sob ameaças à medida que pessoas estranhas constantemente vêm a comunidade com a finalidade de realizar pesquisas minerais, desde então a comunidade vive em alerta, pois esta região onde as empresas pretendem minerar é a área de uso comum e tradicional da comunidade. Ambas as comunidades, além das ameaças por mineradoras, têm em comum, a luta pela regularização de seus territórios. Esse é o direito pretendido por estas comunidades, o que permitirá a garantia de reprodução da vida.
Quanto ao município de Piripá, dentre as comunidades ameaçadas está o Bunito e Queimada. A investida de uma empresa de nome “Barrinha Mineração” na comunidade de Bunito intensificou em 2016, que de forma arbitrária e sem as devidas licenças ambientais chegou a se instalar no território da comunidade, no entanto, a partir de denúncias feitas o empreendimento foi embargado, a empresa multada e pode responder civil e criminalmente pela exploração ilegal. Bunito também está em processo de autorreconhecimento como Fecho de Pasto e estas explorações, além de ocorreram no território da comunidade, ameaçam nascentes que abaste a comunidade e outras que vivem próximo a Serra Geral e dos Gerias.
O conflito mais recente neste município acontece na comunidade de Queimada, neste caso, a exploração mineral está para ocorrer na propriedade do senhor Genivaldo Castro. Trata-se de exploração de forma artesanal para retirada de pedras utilizadas em calçamento de quintais. De acordo com particulares que preferem não identificar, esta “pedreira” conta com interesses do poder público local, Executivo e Legislativo, falam inclusive que a estrada de acesso ao local da exploração foi consertada com máquinas do município. Mais uma vez, são flagrantes ameaças ao meio ambiente e modos de vida. Trata de uma região de encosta da Serra Geral, onde existem nascentes, como: do Tamboril, do Olho D´Água Pelado, Olho D´Água Fundo e Olho D´Água do Ouro, que estão a cerca de 1.000 metros do local da mineração. Estas nascentes são as principais fontes de água que abastece cerca de 13 famílias e nestas proximidades as terras são utilizadas para o plantio de suas roças.
Estas iniciativas de exploração mineral na região são exemplos de conflitos, à medida que outras comunidade também vivem a mesma situação de ameaças. As disputas decorrem de interesses de empresas privadas que veem o subsolo e a exploração mineral como forma de ganhar lucros e acumular riquezas. Por conseguinte, possuem interesses que se confrontam e a exploração mineral, mesmo sendo de interesse público, não pode se balizar somente pelo discurso de que o subsolo é da União, todavia os direitos dos superficiários, os costumes tradicionais, a preservação ambiental integral de certos espaços, o direito de acesso a água limpa, a alimentação saudável e, especialmente, o direito de serem consultados, não podem ser desprezados.
As comunidades tem resistido a estas investidas de mineradoras, se organizam em associações locais e criaram no município de Piripá uma Comissão, a qual conta com representação das comunidades, da Igreja, de entidades e de membros do Legislativo. Este tem sido um espaço de debates sobre questões ambientais e persistem relatos das comunidades que sofrem com empresas do ramo da mineração.
A omissão do Estado quanto a regularização fundiária dos territórios das comunidades têm sido motivo de aumento de conflitos e expõe as famílias. Outra agenda que está no horizonte da Comissão de Piripá é a criação de uma Área de Preservação Ambiental – APA do Qulementão, uma medida que visa resguardar ambientes especiais de suma importância para a preservação ambiental na Serra Geral.
Texto e foto: João Batista Pereira – Agente e assessor jurídico da CPT Sul Sudoeste/BA