No documento assinado por mais de cem bispos do mundo, ressalta-se o pedindo aos Estados de medidas para por fim a ações de empresas que geram violência e sofrimento às populações mais vulneráveis, como sonegação de impostos, violações aos direitos humanos e trabalhistas e destruição de ecossistemas
Mais de cem bispos, dentre os quais cinco do Brasil, assinaram uma carta pedindo aos Estados medidas para por fim a ações de empresas que geram violência e sofrimento às populações mais vulneráveis, como sonegação de impostos, violações aos direitos humanos e trabalhistas e destruição de ecossistemas. “Agora mais do que nunca, precisamos de uma due diligence obrigatória na cadeia de abastecimento para travar os abusos das empresas e garantir a solidariedade global”, afirmam os signatários.
O texto foi publicado, no dia 6 de julho, pela Cidse, uma entidade que reúne organizações católicas pela justiça social e pede a aprovação de legislação que “estabeleça obrigações intersetoriais de due diligence (diligência prévia) sobre direitos humanos, ambiente e governança para todas as empresas e melhorando o acesso aos tribunais das pessoas afetadas pelas violações dos direitos humanos, responsabilizando-as pelos danos que causaram”.
Na crise global sem precedentes, neste contexto de pandemia, “perturbações econômicas e sociais ameaçam os meios de subsistência e o bem-estar a longo prazo de milhões de pessoas”, contexto no qual são particularmente vulneráveis aos piores impactos da crise os milhões de trabalhadores na base da cadeia de abastecimento – entre os quais muitas mulheres, segundo o documento.
Solidariedade diante da irresponsabilidade
Os bispos pedem solidariedade entre os membros “da nossa família humana” para enfrentar a crise. “A nossa forte interligação exige que todos demonstremos responsabilidade uns pelos outros. Mas, muitas vezes, o interesse privado das empresas multinacionais prevalece, quando não conseguem intensificar a solidariedade”, afirmam.
“Há muito que existem empresas irresponsáveis envolvidas em vários abusos, fugindo aos impostos que poderiam servir para construir e manter serviços públicos como hospitais ou escolas, poluindo os nossos solos, a água e o ar, ou sendo cúmplices de graves violações dos direitos humanos em todo o mundo, como o trabalho forçado e o trabalho infantil. E quando as leis ambientais ou sociais põem em risco o lucro, existem provas claras de que as empresas transnacionais por vezes ameaçam os Estados com processos judiciais, recorrendo ao Mecanismo de Resolução de Litígios Investidor-Estado. Este sistema orientado pelo lucro e a cultura descartável por ele trazida tem de ser posto em causa, agora mais do que nunca”.
Os bispos falam numa “obrigação moral e espiritual de falar sobre a urgência de reordenar prioridades durante e após a crise”. O pedido de legislações mais duras por medidas de diligência prévia, principalmente no âmbito dos direitos humanos, deve-se também ao fato de que as orientações e abordagens voluntárias que estão ligadas ao conceito destas práticas no meio corporativo não estão conseguindo proteger as pessoas e o planeta da destruição ambiental e as pessoas dos abusos dos direitos humanos.
“Apelamos a que todos os governos cumpram as suas promessas e obrigações, ao abrigo do direito internacional, para proteger os direitos humanos dos abusos das empresas. […] A legislação deve introduzir uma due diligence obrigatória sobre ambiente e direitos humanos, ou seja, devem ser identificados, avaliados, travados, impedidos e mitigados os riscos e violações do ambiente e de todos os direitos humanos, em todas as suas cadeias de abastecimento, e deve ser substancialmente melhorada a possibilidade de as pessoas afetadas pedirem indenização nos tribunais civis nacionais”.
Instrumento vinculante no Direito Internacional
No documento também pede-se que todos os Estados garantam a sua participação construtiva e ativa nas negociações das Nações Unidas “com vista a um instrumento juridicamente vinculante que regule, no direito internacional sobre direitos humanos, as atividades das empresas transnacionais e de outras empresas”. Dessa forma, havia um tratado que impediria qualquer país ou empresa de recorrer a modelos de produção exploradores e de aceitar a destruição da criação para melhorar a sua posição competitiva no mercado mundial.
Bispos do Brasil
Na primeira versão da carta, cinco bispos do Brasil assinaram: o bispo de Caicó (RN), dom Antônio Carlos Cruz Santos; o arcebispo eleito de Maringá (PR), dom Severino Clasen; o bispo emérito do Xingu (PR), dom Erwin Kräutler; o arcebispo de Porto Velho (RO), dom Roque Paloschi; e o bispo de Tocantinópolis (TO), dom Giovane Pereira de Melo.
Por: CNBB / Cimi