Na última terça feira (21), na comunidade de Fundo de Pasto de Cisterna, em Souto Soares (BA), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Diocese de Irecê celebrou 20 anos de presença e atuação naquela região. Houve à tarde um encontro das comunidades acompanhadas pela CPT e à noitinha uma celebração eucarística de ação de graças. Estiveram presentes, em número equilibrado de homens, mulheres e jovens, camponeses e camponesas de comunidades quilombolas, fundo e fecho de pasto e agentes de pastoral, voluntários e liberados, coordenadores/as, assessores/as, amigos/as, padres, religiosas, missionárias do meio popular e entidades parceiras.
Foi um dia alegre e emocionante de memórias das lutas e conquistas, com suas próprias dificuldades, que marcaram as vidas de tantas pessoas que de uma forma ou de outra estiveram entrelaçadas nos processos em que a CPT se fez presente. Diferentes experiências como visitas às famílias, reuniões, formações, encontros, mutirões, audiências, intercâmbios possibilitaram o fortalecimento das organizações comunitárias e das lutas em defesa dos direitos à terra, à água, aos territórios, à justiça e dignidade do povo do campo, ameaçados pelos projetos do agronegócio, mineração, irrigação, energia eólica etc. Nisso foi muito importante o apoio das entidades parceiras. Uma extensa exposição fotográfica nas paredes da sala favorecia as recordações das pessoas e situações vividas nestes 20 anos.
Nas falas, os/as participantes destacaram a importância da presença e acompanhamento da CPT nos seus processos de organização e resistências, a participação de jovens e mulheres na superação de preconceitos e discriminações de raça, gênero e geração. Elenita Carmo, da comunidade quilombola Barra II de Morro do Chapéu, afimrou que “a CPT ajudou bastante a nossa comunidade a ter consciência de nossos direitos e fazer o processo de autorreconhecimento e defesa do nosso território”.
Já Evanei Martins, uma das voluntárias da CPT Irecê, destacou a importância dos mutirões da Campanha de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo. “Contribuíram para a conscientização de trabalhadores/as relacionada aos seus direitos trabalhistas. Hoje continuam migrando para outros estados, mas não se submetem ao trabalho análogo à escravidão, como é o caso de camponeses/as das comunidades de Canarana que vão trabalhar na colheita da laranja e do café em Minas Gerais”.
Ruben Siqueira, assessor da CPT Regional Bahia, sugere o sentido desta celebração para os povos e comunidades e para a própria CPT: “Celebrar é tornar célebre, inesquecível; fazer memória do que foi vivido porque é decisivo no presente e para o futuro, é a marca da caminhada. Isso só faz sentido para alimentar a continuidade da luta, reafirmar as identidades resgatadas nos territórios re-conquistados e preservados e construir na mesma linha o futuro. Isso é ainda mais importante, hoje, porque com a natureza preservada nos territórios e o modo sustentável de lidar com ela, ajuda de modo decisivo a enfrentar o aquecimento da terra, as crises climática, alimentar, hídrica, pandêmica etc.”. Ir. Evanir Brugali, das Salvatorianas, em Xique-Xique, voluntária da CPT de longa data, conclui: “Este é um apelo com muito amor, de nunca cansar de servir com amor, assim como nos pedem Jesus e o Papa Francisco: continuem na luta!”.
CPT é Evangelho encarnado na luta do povo
Durante a celebração, o padre José Carlos enfatizou a espiritualidade da CPT e de outras pastorais sociais que assumem o Evangelho de Jesus Cristo encarnado na vida do povo, na linha da “Igreja em saída” proposta pelo Papa Francisco. “Ouvir, contemplar e agir, colocar os pés a caminho, ao encontro de quem precisa. Daí que a CPT se tornou a principal referência nos processos de sistematização das lutas dos povos, denúncia e registro dos conflitos no campo no Brasil”, disse o padre José Carlos. Outro aspecto por ele mencionado é a prática do macroecumenismo defendida pela CPT, que corresponde ao respeito às diferentes religiões e religiosidades presentes nas comunidades, que não se tornam obstáculos, mas colaboram para todos/as juntos/as construir unidade e fortalecer a defesa dos direitos socioambientais, cada vez mais ameaçados.
“A CPT vem clarear a nossa luta e nos ajudar a caminhar de mãos dadas para defender o patrimônio que temos; imagina a gente perder a água? A gente faz a defesa das terras porque temos uma riqueza imensa que são as várias nascentes, até hoje desconheço um bem precioso maior que água. É o bem maior que a humanidade tem, sem água não dá pra gente sobreviver. E as nossas serras, os paredões, os animais, a fauna e flora, as pinturas rupestres e cavernas, a gente não quer perder isso, que é um pedaço do céu que temos aqui, é um paraíso. Não queremos perder isso para as empresas, estamos na caminhada lutando para que juntos possamos fazer a defesa deste território e a gente agradece muito a CPT por nos ajudarem nesta caminhada.” – declarou Joaquim Roque, da comunidade fundo de fasto de Cisterna.
A partilha alegre e festiva do lanche diverso e saboroso trazido pelas comunidades encerrou a celebração dos 20 anos da CPT Irecê, que animou a todos e todas à continuidade da caminhada das comunidades e dos agentes pastorais “rumo à Terra Sem Males”.
Texto e fotos: Equipe CPT Centro-Oeste