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CPT BAHIA

A Missão da Terra em Saúde – Bahia (Diocese de Bonfim): 35 anos de “Caminhadas”

Foi um evento “co-movente”, até para alguém acostumado a este tipo de celebrações. Sem lágrimas, mas com muito entrosamento solidário e compromisso.201.10.01 - 35ª Missão da Terra - Saúde (9)

Voltando para casa, á noite deste dia 28 de setembro, na penumbra do ônibus, diversas imagens desta missão da terra 2014, em Saúde – região de Bonfim – BA, passaram novamente na minha frente; diante da participação maciça e consciente de muita gente, (cerca de 5-6 mil pessoas) surgia-me, insistente como um refrão, uma pergunta que partilho com os que estão lendo estas linhas: porque a maioria dos eventos culturais, religiosos, e até as missas, etc. são, em geral, tão pouco co-moventes?

Co-movente, para mim, foi ver 50 jovens que, atendendo ao convite de animadoras e animadores da equipe da CPT e das lideranças comunitárias da paróquia de Saúde, se reuniram e se inteiraram da motivação da Missão ou Romaria da Terra.

Percebi neles e em muitos adultos unidos a eles, a alegria de se oferecerem dando do seu tempo e de suas capacidades, em atitude de trabalho de equipe. De fato, acolheram e informaram, com carinho, as pessoas, direcionaram o trânsito, mataram a sede e cuidaram da saúde de uma multidão de romeiros e romeiras da terra e das águas que iniciaram cedo e terminaram um dia de domingo, na cidade deles. Vi ocorrer isso, no ano passado igualmente, em Andorinhas. Todo ano se renova, nesta região, este encontro prazeroso e exigente, de fé e de vida. Exigente em termos de gastos e de desgaste físicos, mas prazeroso e motivador, por dentro e por fora de seu ser, como pessoas e comunidades. Estes longos momentos, chegando à numeração da maturidade dos 35 anos, envolvem, além da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lideranças populares dos movimentos sociais, leigos e leigas, padres, religiosas, jovens e idosos…

Após 35 anos, resulta claro como o sol, que isso não se improvisa do dia para a noite. Não há convocações de autoridades ou marketing religioso que possam produzir isso; mesmo com a devida ressalva de não ser um perito sociólogo ou psicólogo, não tenho receio em afirmar que estas romarias da Terra e das Águas, entraram profundamente na cultura de uma fé adulta e já contam com uma intervenção direta, livre e participativa, quase natural, aqui como em outros lugares. Em Saúde, o povo da diocese toda de Bonfim, foi convocado a se “comover” e, com entusiasmo, muitos se “moveram com”. A cada momento, de maneira espontânea ou nas ações organizadas e propostas, emergiram e brilharam as tradições populares de cultura, resistência, e inspiração nordestina. Esta inspiração bebe abundantemente, ainda hoje, em sua história feita arte e resistência, canto, música, grito e denuncia… Tudo se insere e ecoa, harmoniosa e criativamente, com os momentos fundantes das experiências de Deus, narradas na Bíblia.201.10.01 - 35ª Missão da Terra - Saúde (2)

Os eixos da Romaria de Saúde deste ano, a partir da contemplação de meus olhos e coração, foram os seguintes:

ACOLHIDA – O povo dos pobres é acolhido, reconhecido valorizado e animado numa esplanada adjacente a um posto de gasolina a 3 km do centro da cidade de Saúde. Nada de show de cima para baixo, mas uma interlocução inteligente, respeitosa, celebrando a alegria do reencontro.

CAMINHADA – A caminhada de 5-6 mil pessoas de toda a região foi ágil, calma e, ao mesmo tempo, pressurosa. O povo conta, canta e grita sua fé. As gerações presentes se abraçam e se reencontram caminhando!… Missão da Terra é contemplação popular pura, movimentada e alegre! Contemplação do Deus de tantos nomes e de tantas culturas.

Contemplação de sua presença real, neste caminhar, com Bíblia e história interligadas. É isso que permite, nas romarias da terra, interpretar e descortinar os horizontes de ameaças e de esperança dos pobres: camponeses, pescadores, quilombolas, índios, idosos, mulheres, crianças, jovens, idosos; são ameaças e esperanças de suas terras e águas , de seu planeta doação “criativa” de Deus para ser a casa de todos!

CONTEMPLAÇÃO – Esta contemplação fixou olhos e corações na morte do Rio da Mangueira, (entrada da cidade) na obrigação da justiça (em frente ao fórum de Saúde) em coibir a indústria da morte e da exploração que chegam a “traficar e escravizar tudo” como, de forma contundente, mostraram, em suas dramatizações, o grupo de teatro da paróquia de Saúde, a PJMP de Caém, a escola família agrícola de Quixabeira e o projeto “Conviver” de Saúde. Um Cristo coletivo permanentemente morto e ressuscitado!

COMUNICAÇÃO. A Cultura do povo foi exuberantemente mostrada e acolhida na memória dos cartazes e na seleção fotográfica dos 35 anos, preparadas pela CPT local e se tornou arte, humorismo, denuncia e drama em muitos pronunciamentos, logo após as farofas comunitárias da metade do dia.

EUCARISTIA. Foi o momento para reiniciar tudo, de novo, sempre: “Fazei isto em memória de mim”. Ao redor das palavras bíblicas, do pão e do vinho consagrados, celebrou-se a continuidade da caminhada do mais verdadeiro “corpo e sangue de Cristo vivo”, a multidão, alimentada e abastecida de esperança, presente na praça de Saúde. Após isso, todos se despediam fraternalmente voltando para suas comunidades. Acenando com as mãos das janelas dos ônibus e com entusiasmo redobrado para defender o planeta e os direitos humanos de seus habitantes deste pedaço de semiárido baiano. Com novas organizações e uma nova maneira encarar a fé como promotora da politica diferente que todos almejamos.

Luciano Bernardi,  da CPT Bahia.

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