cropped-logo-cpt-1.png
Acesse o Caderno de Conflitos no Campo Brasil 2023

CPT BAHIA

Como a especulação fundiária impulsiona o desmatamento

FOTO GETTY IMAGES

Esta dissertação, elaborada por Mateus de Souza Macul, no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), demonstra que a perda de cobertura florestal na Amazônia não é influenciada apenas por demandas da produção agropecuária, mas envolve também as dinâmicas e disputas do mercado fundiário.

A análise foi feita a partir de um estudo de caso da região de fronteira agropecuária de Novo Progresso, no Pará. Para apoiar a investigação, foi desenvolvido um índice numérico que representa a valorização das terras no espaço. Essa variável foi então aplicada a um modelo estatístico que incorporou outros fatores relacionados a aspectos fundiários, ambientais, socioeconômicos e infraestruturais.

A qual pergunta a pesquisa responde?

Como a demanda por terras influencia o desmatamento em regiões de fronteira agropecuária?

Por que isso é relevante?

O entendimento sobre o desmatamento na Amazônia geralmente busca atrelar o desenvolvimento econômico à perda de cobertura florestal. No entanto, é notável que o crescimento do PIB agrícola dessa região entre os anos de 2004 e 2016 contrasta com uma desaceleração do desmatamento monitorado. Essa constatação sugere que outros elementos estão relacionados ao desmatamento, e diversos pesquisadores indicam que fatores ligados ao mercado fundiário e a disputas por terra devem ser levados em consideração — principalmente nas regiões de expansão agrícola e pecuária, onde a especulação por terra e a grilagem ocorrem com mais intensidade.

Daí a importância da abordagem proposta por este trabalho, que busca representar a valorização das terras no espaço, por meio da criação de um indicador numérico (o Índice de Valorização da Terra, ou IVT) e da incorporação de variáveis relacionadas à situação fundiária.

Resumo da pesquisa

A fim de investigar o avanço da demanda por terras sobre a floresta e a relação do mercado fundiário com o desmatamento, foi feito um estudo de caso da região de fronteira agropecuária de Novo Progresso, localizada no sudoeste do Pará. O recorte temporal adotado foi de 2014 a 2017, porque nesse período observou-se um aumento no investimento em infraestrutura no local e um crescimento da pressão por ocupação agropecuária.

Para apoiar a investigação, foi desenvolvido um Índice de Valorização da Terra com base na literatura e em entrevistas de campo, elencando o custo de oportunidade nas diferentes localidades da área de estudo. O IVT foi posteriormente submetido a um teste de sensibilidade para avaliar sua robustez. Após esse processo, foi feita uma análise estatística do desmatamento na região, incorporando o IVT e outras variáveis relacionadas a aspectos fundiários, ambientais, socioeconômicos e de infraestrutura.

Quais foram as conclusões?

A criação do IVT foi bem sucedida, e o índice se mostrou útil e robusto para representar o mercado de terras no espaço e estudar o desmatamento. A partir disso, a incorporação de variáveis associadas ao mercado fundiário na análise explicitou a forma como sistemas econômicos extensivos são desenvolvidos em regiões de fronteira. A especulação fundiária pressiona por transformar as terras com florestas em mercadorias, que são subsequentemente convertidas em áreas abertas para produção agropecuária, tornando-as mais atrativas. Os fatores relacionados à questão fundiária demonstraram que a discussão sobre a demanda por terra não se resume aos processos produtivos, mas envolve também as disputas do mercado.

O trabalho demonstrou, portanto, a viabilidade de incorporar esses fatores na modelagem do desmatamento. Diferentes estudos de caso podem adotar essa abordagem em suas análises, fornecendo mais informações às políticas de combate ao desmatamento e melhorando sua eficácia.

Quem deveria conhecer seus resultados?

Agentes públicos tomadores de decisão que trabalham com o combate ao desmatamento na Amazônia na esfera federal, estadual e municipal; instituições que lidam com a governança de terras no Brasil, como o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária); pesquisadores interessados por temas relacionados a desmatamento na Amazônia, mercado de terras, questão fundiária, análise espacial e sensoriamento remoto.

Mateus de Souza Macul é bacharel em engenharia florestal pela Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo) e mestre em sensoriamento remoto pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), onde atualmente atua com pesquisa e desenvolvimento no Programa Queimadas.

Referências:

  • AGUIAR, A. P. D.; C MARA, G.; ESCADA, M. I. S. Spatial statistical analysis of land-use determinants in the Brazilian Amazonia: exploring intra-regional heterogeneity. Ecological Modelling, v. 209, n. 2/4, p. 169–188, 2007.
  • BECKER, B. K. Geopolítica da Amazônia. Estudos Avançados,v. 19, n. 53, p. 71–86, 2005.
  • COSTA, F. D. A. Mercado de terras e trajetórias tecnológicas na Amazônia. Economia e Sociedade, v. 21, n. 2, p. 245–273, 2012.
  • COSTA, F. A. Contributions of fallow lands in the Brazilian Amazon to CO2 balance, deforestation and the agrarian economy: inequalities among competing land use trajectories. Elementa: Science of the Anthropocene, v.4, p. 133, 2016.
  • COSTA, F. A.; FERNANDES, D. A. Dinâmica agrária, instituições e governança territorial para o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Revista de Economia Contemporânea, v. 20, n. 3, p. 517–518, 2016.
  • VALERIANO, D. M.; ESCADA, M. I. S.; C MARA, G.; KAMPEL, S. A.; MAURANO, L. E. P.; ALMEIDA, C. A.; MONTEIRO, A. M. V. Dimensões do Desmatamento na Amazônia Brasileira. In: MARTINE, G. (Ed.). População e sustentabilidade na era das mudanças ambientais globais: contribuições para uma agenda brasileira. Belo Horizonte: ABEP, 2012.

Via Nexo Jornal: https://www.nexojornal.com.br/academico/2020/12/31/Como-a-especula%C3%A7%C3%A3o-fundi%C3%A1ria-impulsiona-o-desmatamento

Gostou desse conteúdo? Compartilhe
Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp