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CPT BAHIA

Cacique Pataxó relata as esperanças e frustações em relação ao julgamento do marco temporal

por Ingrid Macedo, via Assembleia Popular

Entre os dias 5 e 8 de junho, uma comitiva dos 3 povos do sul da Bahia (Pataxó, Pataxó Hãhãhãe e Tupinambá) se locomoveu até Brasília para acompanhar o julgamento da tese do Marco Temporal no Supremo Tribunal Federal (STF). Ao todo, estima-se que 2 mil indígenas de todo o Brasil participaram da mobilização. Na quarta-feira (7), o voto do ministro Alexandre de Morais rejeitou a tese e seu posicionamento foi recebido com certo alívio pelos indígenas, que enfrentam nos últimos anos a intensificação das violências, injustiças e violações de seus direitos originários.

Caciques e lideranças Pataxó em frente ao Supremo Tribunal Federal, 07 de junho de 2023. Imagem: Acervo pessoal/Mãdy Pataxó.

Em conversa sobre a ida ao Distrito Federal, o cacique Rodrigo Mãdy (aldeia Rio do Cahy – T.I. Comexatibá) enfatizou a importância do voto do ministro: “É um passo positivo para os povos indígenas do Brasil que vem sendo massacrados por essa bancada ruralista e colonialista que quer destruir toda a vida dos povos originários (…) é um voto muito importante para que esta bancada saiba que irá perder a batalha”.

Por outro lado, apontando questões negativas em relação à pauta do STF e a mobilização na capital, o cacique destaca que “em 523 anos de invasão a decisão dos direitos indígenas ainda está no poder do homem branco”: após o voto de Moraes, o ministro André Mendonça (indicado ao STF pelo ex-presidente Jair Bolsonaro) pediu vistas do processo, estendendo a próxima votação em até 90 dias e, consequentemente, estendendo também o período de forte insegurança jurídica que ameaça os direitos dos povos nativos.

Ministra Sônia Guajajara discursa ao lado da deputada federal Célia Xakriabá, à esquerda. Foto: Kamikia Kisedje. Disponível em: https://www.instagram.com/p/CtLnLGsuio6/.

Mãdy enfatiza ainda que o pedido de vista traz graves consequências que refletem diretamente nas comunidades que estão nas bases das ocupações, pois causa agitação aos ruralistas, que se mobilizam e, através de pistoleiros, intensificam as ofensivas aos territórios tradicionais em disputa. O julgamento voltou em pauta no STF após um intervalo que durava desde 2021 e, neste período, os ataques contra o povo Pataxó no extremo-sul da Bahia aumentaram de maneira exponencial. De fato, 9 entidades defensoras dos direitos humanos – entre elas a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e a Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME) – enviaram um relatório à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em março deste ano, afirmando que 12 mil pessoas do povo Pataxó estão vivendo sob uma “guerra de baixa intensidade” no extremo-sul da Bahia.¹

Acerca da organização da mobilização e a forma em que as delegações foram tratadas, o cacique afirma que “entra governo e sai governo e as violências continuam”, se referindo ao fato de que no dia da votação os grupos do movimento foram divididos em diferentes locais e apenas um pequeno número de pessoas pôde entrar para assistir a sessão. Também, algumas pessoas que se encontravam em frente ao STF foram tratadas com hostilidade por policiais, por carregarem consigo seus adereços, lanças, arcos e flechas, tacapes e materiais ritualísticos. Mãdy assegura que esta situação fere o Artigo 231 da Constituição Federal, que garante aos povos nativos seus costumes e tradições. “Esperamos que isso seja corrigido até os próximos votos, para que não aconteça mais e seja menos uma violência contra nossos povos”.

Além disso, a Apib sinalizou preocupação com o teor do parecer de Alexandre de Moraes, que propôs um “meio termo” para conciliar os interesses daqueles que têm propriedades que sobrepõem terras indígenas e o direito originário dos povos ao território tradicional. Segundo Maurício Terena, advogado e coordenador jurídico da Apib, essa possibilidade pode trazer insegurança jurídica para os indígenas. “O que mais nos preocupa neste voto do ministro é a indenização prévia. Isso quer dizer que as pessoas podem pagar pelo território e já adentrar nele. Isso pode gerar confusão interna entre os parentes e uma insegurança jurídica. Não se concilia direitos indígenas. Não tem meio termo para nós”.

Pronunciamento do cacique Mãdy Pataxó. Brasília, 7 de junho de 2023. Imagem: Hellen Loures/Cimi.

Apesar de todas as problemáticas, o movimento indígena e seus apoiadores exigem que o Supremo retome o julgamento o mais breve possível. A mobilização contra o Marco Temporal continuará a nível nacional para reivindicar a contenção do violento avanço do latifúndio sobre terras indígenas e a derrubada da intencionalidade de inviabilizar os direitos dos povos originários.

Diga ao povo que avance, avançaremos!

Demarcação já!

Ingrid Macedo, de nome indígena Juacema, pertence ao povo Pataxó, é artesã, comunicadora popular e integra o coletivo Brasil Vermelho.

¹ Apib e Apoinme denunciam guerra contra o Povo Pataxó na Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Apib Oficial

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